A cachaça, a mais brasileira das bebidas e cuja história se mistura com a do País, passa por um momento de sofisticação. Os lançamentos alcançam cifras altas, o cuidado com as garrafas está cada vez maior, os bares que a têm como carro-chefe fazem sucesso, o marketing é agressivo, e até as mulheres têm provado e aprovado a bebida. Ficou chique sair para beber cachaça, colecionar garrafas e entender do assunto. Os esforços dos produtores têm surtido efeito e, aos poucos, a cachaça perde o estigma de bebida de boteco. Hoje, bebe-se em bares elegantes de bairros de classe média alta, como a Universidade da Cachaça, do chef Sergio Arno, ele próprio um colecionador de aguardente.
Há duas semanas, a Sagatiba, empresa que produz cachaça premium, começou a vender as primeiras garrafas da Sagatiba Preciosa, uma edição limitada de um lote raro produzido em 1982 e envelhecido por 23 anos. No ponto-de-venda, o preço final é de cerca de R$ 600. Dez unidades da bebida já haviam sido vendidas antes mesmo do lançamento nacional, em três leilões realizados pela famosa casa Christie's, em Londres, Paris e Amsterdã. Algumas garrafas alcançaram o preço de R$ 2 mil. Todo o design e produção foram feitos em Paris pela Saverglass, uma das mais tradicionais empresas de embalagem de vidro do mundo.
A Sagatiba, que nasceu em 2003, gastou nesses últimos quatro anos U$ 40 milhões em investimento global (marketing, estrutura, etc). Cresceu 450% em 2006, em comparação ao ano anterior. Neste ano, a expectativa é de aumentar o faturamento em até 100%, segundo Régis Tina, diretor comercial da empresa. Foram mais de um milhão de garrafas vendidas no ano passado e 35% desse total foi exportado.
De acordo com César Rosa, presidente do Instituto Brasileiro da Cachaça, a produção anual da bebida gira em torno de 1,1 bilhão de litros. A revista inglesa Drinks International aponta a Pirassununga 51 em terceiro lugar no ranking de bebidas destiladas mais consumidas no mundo – atrás apenas do coreano Jinro (um tipo de saquê) e do gin das Filipinas Ginebra San Miguel. A revista nem leva em conta o que é exportado, apenas o que é consumido de caninha 51 no Brasil.
O instituto tem outros números do mercado nacional, que não deixam de impressionar: 40 mil produtores, quatro mil marcas, 600 mil empregos diretos, 189 exportadores. "É um mercado estável. O produto com valor agregado para as classes A e B tem maior potencial de crescimento", diz Rosa. "O preconceito com relação à bebida diminuiu nos últimos dois anos, mas ainda existe."
Branquinhas
Na última Brasil Cachaça, feira realizada no final de abril em São Paulo, brilharam justamente as "branquinhas" mais nobres, como a edição especial da Sarau Cachaça Dona Beja, envelhecida 34 anos, ao preço de R$ 1 mil. A Angelina Tabacos também lançou sua cachaça premium – a Série A Cambuci. Pensada para fazer dupla com charuto, vai custar cerca de R$ 195. O evento registrou crescimento de 100% em relação ao ano anterior, recebendo cerca de 21 mil visitantes, segundo o diretor Leandro Lara.
Em 1990, o paulista Delfino Golfeto abriu, nas palavras dele, um boteco bem simples, mas "muito bonito", onde a estrela seria a cachaça. Do assunto, Golfeto entendia. Afinal ele foi durante 20 anos técnico de açúcar e álcool e gerente de usinas do setor. "Coloquei meus diplomas em uma gaveta e meti a cara no boteco", diz.
Hoje, o bar (em Tupã) virou rede – a Água Doce Cachaçaria tem 97 endereços em 12 estados e abre, em média, cinco novas casas por ano. "Tivemos que limitar o crescimento para não perdermos o controle. E aumentaram as vendas nos bares, quando diminuímos o número de abertura de lojas", comenta Golfeto.
Consumo feminino
O empresário, conhecido como embaixador da cachaça e idealizador do Museu da Cachaça de Tupã, diz que o consumo da bebida entre as mulheres tem aumentado visivelmente. "E elas também estão se tornando experts! Demoram três vezes mais para tomar uma dose, apreciando melhor a bebida. Essa sensibilidade nos surpreende." Golfeto recomenda que cada dose de 50 mililitros seja tomada em 20, 25 minutos. "Os homens tomam em 10 minutos, 15 no máximo".
A unidade da Água Doce em Moema, na capital, de propriedade de Vander de Castro, exigiu um investimento de R$ 850 mil, mas uma franquia menor pode ser aberta com R$ 250 mil. "Com uma casa pequena gasta-se bem menos e o risco não é tão grande, mas o retorno também é menor", diz.
Por Kety Shapazian (Diário do Comércio-SP)
quarta-feira, 9 de maio de 2007
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