A indústria de cerveja está investindo como nunca no tema "consumo responsável" do álcool. As empresas do setor, capitaneadas pela AmBev, já tinham incorporado o discurso, mas estão reforçando suas ações justamente no momento em que a Anvisa pretende restringir a publicidade das bebidas com mais de 0,5 grau de teor alcoólico.
As três maiores do segmento, estão com algum tipo de investimento na área. A Schincariol está há uma semana com uma nova campanha no ar abordando o tema "se beber não dirija" e a Femsa - que, ao contrário das concorrentes não faz campanhas na TV sobre o tema - lança na próxima semana uma "blitz" em 200 mil pontos-de-venda para desestimular a venda de bebidas alcoólicas a menores. Ontem, durante uma hora e meia os 35 mil funcionários da AmBev - distribuídos entre 32 fábricas, 40 centros de distribuição - pararam para assistir vídeos educativos sobre consumo responsável e alguns deles partiram para uma "blitz" em universidades.
Em São Paulo, na sede administrativa da AmBev, quem apresentou o tema aos funcionários foi o próprio presidente da companhia, Luis Fernando Edmond. "Não vamos esperar o governo tomar iniciativa, vamos aproveitar o tamanho que temos e o fato de trabalharmos com jovens para disseminar o consumo responsável", afirmou.
Para o especialista no assunto, o psiquiatra Arthur Guerra, presidente do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool, não é a indústria quem deve assumir esse papel. "Por melhor intenção que as empresas tenham em tocar no assunto, não se pode depender da indústria para abordar o consumo responsável. É uma inversão de valores" afirma.
Claro que o objetivo da indústria é lucrar com a venda de cerveja. Mas ficar de fora dessa discussão agora pode ser muito pior. "Somos focados no curto prazo, sim, mas não podemos ignorar o que possa nos prejudicar no longo prazo", disse Milton Seligman, diretor de assuntos corporativos ao Valor. "O consumidor consome muito mais ao longo de sua vida se não tiver problemas com o álcool", disse Edmond.
Desde 2001, quando iniciou o programa de consumo responsável, a AmBev doa bafômetros ao governo. Ontem foram doados 6,2 mil aparelhos em seis capitais brasileiras e nos últimos seis anos foram 31,2 mil.
A questão chegou a um ponto que não permite omissão por parte da indústria, segundo dados do Instituto Médico Legal (IML), metade dos acidentes de trânsito fatais estão relacionados ao álcool e uma pesquisa divulgada há duas semanas pela Secretaria Nacional Anti-Drogas, 9% da população brasileira é dependente de álcool, perto de 17 milhões de pessoas.
A Anvisa pretende proibir a veiculação, no rádio e na TV, de propaganda de bebidas com baixo teor alcoólico entre oito da manhã e oito da noite. As frases "beba com moderação" ou "se beber, não dirija", que já integram as campanhas, foram consideradas insuficientes e, por conta disso, o material de divulgação também terá de conter frases de advertência para os prejuízos à saúde provocados pelo consumo exagerado desses produtos.
Para Milton Seligman, da AmBev, a simples proibição da propaganda não funciona. "Será apenas um atalho, esse tipo de questão precisa de uma solução complexa", afirma, acrescentando que as autoridades têm mostrado abertura para dialogar. "Nenhum médico vai defender propaganda de bebida alcoólica, mas também não existem estudos que comprovem que as campanhas estimulem, de fato, o consumo do produto, diz Arthur Guerra.
Hoje o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, participa de uma mesa redonda sobre consumo de álcool e propaganda com o sindicato da indústria de bebidas e agências de publicidade. (Daniela D'Ambrosio-Valor Econômico)
segunda-feira, 3 de setembro de 2007
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