domingo, 29 de abril de 2007

‘Turistas fotografam, mas não levam’

Donos de boxes tentam se adaptar aos novos freqüentadores, que são mais sofisticados e compram menos

BRUNO PAES MANSO E HUMBERTO MAIA JUNIOR

O avô, Luigi Pugliesi, chegou da Itália para vender melancias por atacado em 1933, quando o Mercado Municipal foi inaugurado. O pai, Eduardo, continuou na casa. Chegava a vender um caminhão de melancias por dia. Há oito meses, José Eduardo, o neto, não agüentou a queda no volume de vendas. Os 30 caminhões mensais não passavam de quatro. Para não fechar, arriscou abrir uma lotérica no antigo boxe. “Os clientes chegam aqui para comer. Não querem mais sair com melancia embaixo do braço”, diz José Eduardo. “Além disso, os caminhões não podem mais estacionar para pegar mercadorias.”

Não é só a reforma que motiva as trocas de ramo. Para os vendedores de frutas e de peixe, os hipermercados tornaram-se um inimigo. Como essas redes oferecem produtos variados, podem fazer promoções imbatíveis para atrair clientes. “Eles colocam uma maçã a preço de custo para lucrar mais com o leite condensado”, explica Nivaldo Goiano, gerente da barraca de fruta Geração Saúde e de duas lanchonetes.

Outras explicações são mais criativas. João Carlos de Freitas, que vende peixes no Mercadão há 44 anos, culpa o desrespeito a antigas tradições. “As pessoas não respeitam mais a tradição e até o papa liberou carne na quinta-feira santa. Também cresceu o total de evangélicos em São Paulo e eles podem consumir carnes no período.”

Ivan Amaro, que quer transformar sua barraca de fruta em uma pet shop, reclama dos turistas que passaram a freqüentar o mercado. “Alguns chegam a tirar fotos das frutas para mostrar aos parentes. Eu pergunto a eles: por que não comprar em vez de mandar fotos?”

No mezanino acima do boxe de Amaro, Horácio Ferreira Gabriel, de 31 anos, a situação é diferente. Dono do Hocca Bar, que vende os tradicionais pastéis de bacalhau e sanduíche de mortadela, ele estima que as vendas aumentaram pelo menos 15% desde o fim da reforma. “Começou a vir um público de classe A que não vinha antes.”

ADAPTAÇÃO

Alguns donos de boxes tradicionais, porém, preferem não se queixar da mudança do perfil dos freqüentadores e se adaptam para atender essa nova clientela. Leonardo Chiappetta, dono do Emporio Chiappetta, que vende azeites, vinhos e enlatados, entre outros produtos, admite a queda no faturamento, mas diz ter feito um trabalho com os funcionários para especializar o atendimento e cativar os turistas.

Além de atrair os clientes, os funcionários contam a história dos produtos. Um vinagre balsâmico, por exemplo, raramente é vendido sem que haja uma explicação de sua origem. Vale até derramar um pouco num pedaço de pão italiano e oferecer para o comprador em potencial. “Hoje é preciso um esforço danado para vender um artigo”, explica. “Mas temos de nos adaptar às mudanças.”

Para manter a tradição da família, que vende queijo há quatro gerações, Roque Bueno Tadeu Peta, conhecido como Roni, conseguiu uma licença do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) para mudar o boxe comercial e fabricar queijos dentro do Mercadão duas vezes por semana. Será um projeto piloto, que pode se espalhar para outros empreendimentos.

“Seria interessante se conseguíssemos transformar o mercado em um grande centro gastronômico, mais dinâmico, onde se produza carnes especiais na hora, com tempero que o cliente quer, onde ele possa experimentar fumos de corda, essas coisas.”

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