quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Cidade gaúcha "exporta" churrasqueiros

Nova Bréscia, a 161 km de Porto Alegre, viu sua população encolher de 11 mil para menos de 3.300 habitantes

Apontado como o criador do rodízio de carnes, Albino Ongaratto deu início ao êxodo em 1967

JOSÉ MASCHIO
ENVIADO ESPECIAL A NOVA BRÉSCIA (RS)

Mesmo sem saber, quem frequenta churrascarias certamente já encontrou um bresciense. Criadores do rodízio de carnes, os naturais de Nova Bréscia (RS) ganharam "know-how" de churrasqueiros e se espalharam pelo Brasil e por 16 países.
Cálculos da Prefeitura de Nova Bréscia (161 km de Porto Alegre) apontam que hoje 10 mil brescienses atuam na atividade longe do município. Por isso, a cidade encolheu -tinha, na década de 60, 11,2 mil habitantes e, hoje, tem menos de 3.300.
O êxodo de brescienses começou em 1967, quando Albino Ongaratto (1928-2007) deixou a cidade natal e montou a churrascaria Jacupiranga, no km 477 da BR-116, em Registro (SP), próximo à divisa com o Paraná.
Apontado como o criador do "espeto corrido", o rodízio de carnes, Ongaratto acabou levando outros brescienses a seguirem seu caminho.
O roteiro geralmente é este: deixam Nova Bréscia na adolescência para trabalhar de copeiro. Depois, passam a garçons e, finalmente, montam uma churrascaria.
Apesar de ajudar a espalhar churrascarias pelo mundo, Nova Bréscia não possui nenhuma. Por quê? O prefeito, Diogenes Laste (PP), 49, esclarece: "É que aqui cada um acha que faz o melhor churrasco. Logo, não precisa de uma churrascaria".

"DIÁSPORA"
Um dos filhos ilustres de Nova Bréscia que seguiu a tradição é Neodir Mocellin, dono da rede Porcão, com unidades no Rio, Brasília e Belo Horizonte.
Os quatro filhos de Germano Laste, 83, também provam esse talento. Ex-alfaiate e representante comercial, Laste viu seus filhos deixarem Nova Bréscia para construírem uma rede de churrascarias pelo Brasil, onde a mais conhecida é a Vento Haragano, em São Paulo.
Muitos voltam para a terra natal para se aposentar. É o caso de João Carlos Biazibetti, 49, que saiu de Nova Bréscia há 20 anos para trabalhar como copeiro no Rio e se tornou dono de churrascarias na capital fluminense e em São Gonçalo.
Hoje, deixou os negócios para os parentes sócios. "Fiz de tudo em uma churrascaria nesses anos. Agora, só quero jogar bocha, cuidar da minha horta e torcer para o Inter."


"Garçom trapalhão" teria criado rodízio

DO ENVIADO A NOVA BRÉSCIA (RS)

A versão preferida pelos brescienses para a criação do "espeto corrido" é a de um garçom trapalhão, que vivia confundindo pedidos na churrascaria Jacupiranga, de Albino Ongaratto, em Registro (SP).
Para resolver a confusão -a troca de espetos-, Ongaratto decretou que os espetos com os diversos tipos de carne seriam passados de mesa em mesa. Surgia o rodízio de carnes.
Adelcio Domingos Cestari, 64, que saiu de Nova Bréscia em 1967 para trabalhar com Ongaratto, prefere atribuir à visão empresarial do ex-patrão a criação do sistema.
"Naquela época não existia rodízio sofisticado como hoje, com muitos tipos de carne. Eram no máximo cinco ou seis as variedades. Albino, com visão, criou o sistema de rodízio para facilitar o serviço e oferecer opções aos clientes", afirma Cestari.
Ele nega ter sido o garçom trapalhão e diz que o sistema criado por Ongaratto foi o "ovo de Colombo" para o crescimento em todo o país das churrascarias. E o "espeto corrido" é o responsável êxodo dos brescienses.
Reverenciado na cidade como herói, Ongaratto deixou uma tradição familiar em churrascarias. Hoje, as segunda e terceira gerações dos Ongaratto administram churrascarias de luxo pelo Brasil. A Batel Grill, em Curitiba(PR), por exemplo, é de descendentes de Ongaratto. (JM)
(Folha de S.Paulo 18/08/2010)

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